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Milton Santos é homenageado no espaço público de Salvador

Niterói, 28 de fevereiro de 2022

Foto do geógrafo em 1994/Foto: Jorge Maruta/USP Imagens

Depois de Paulo Gustavo tornar-se nome de rua em Niterói, retirando a homenagem ao cel. Moreira César, que morreu em Canudos, agora foi a vez do geógrafo Milton Santos (1926 – 2001) ter seu nome atrelado ao espaço público, não em Niterói, mas em Salvador. Desde o final de fevereiro, a prefeitura da capital baiana sancionou lei que transformou a então Av. Adhemar de Barros em Milton Santos.

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A trajetória de Milton Santos
Nascido em Brotas de Macaúbas, no interior da Bahia, Santos vem de uma família de professores. Já em Salvador, aos 15 anos, ele começou a lecionar geografia, porém, graduou-se em Direito na UFBA. Isso não impediu que o personagem abandonasse a geografia. Ele foi para Ilhéus lecionar no colégio municipal da cidade a mencioanda disciplina. Também a partir de Ilhéus, atuou no Jornal da Tarde.
Na década de 1950, Santos foi convidado a ingressar no doutorado na Universidade de Estrasburgo, na França, onde defendeu a tese 'O Centro da Cidade de Salvador'.
Em 1964, com o golpe militar, Santos chegou a ser preso e, ao abandonar o cárcere, foi lecionar na França, onde obteve o seu primeiro título de Doutor Honoris Causa. Também durante seu exílio, lecionou em universidades dos EUA, Canadá, Tanzânia, Venezuela e Peru.
De volta ao Brasil, atuou como professor na UFRJ até 1983. No ano seguinte, tornou-se titular na USP.
Em 1994, Santos recebeu o prêmio Vautrin Lud, considerado o "Nobel da Geografia", tendo sido o primeiro latino-americano a receber a distinção. No ano seguinte, tornou-se Comendador da Ordem Nacional do Mérito Científico e, em 1997, recebeu o #Jabuti de Literatura pelo livro A Natureza do Espaço – Técnica e Tempo, Razão e Emoção.
No que diz respeito aos seus livros, Santos publicou mais de 40, tanto no Brasil, quanto no exterior.

 

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Homenagem a António Manuel Hespanha

Niterói, 02 de julho de 2019.

Da redação.


Foto do Prof. Dr. António Manuel Hespanha/Fonte: Flickr UFPR.

Foto do Prof. Dr. António Manuel Hespanha/Fonte: Flickr UFPR.

 

Faleceu no último dia 01 de julho de 2019, em Lisboa, o historiador António Manuel Hespanha, aos 74 anos. O pesquisador veio a óbito em virtude de um câncer. Em razão do triste fato, a Revista Tema Livre relembra nas linhas que se seguem e de forma sucinta a trajetória do intelectual português, que marcou a historiografia lusófona.

 

Hespanha nasceu em Coimbra, em 1945, nos tempos do Estado Novo português. Em 1967, na prestigiosa universidade da cidade que o viu nascer, graduou-se em Direito e, logo em seguida, em 1971, obteve o título de mestre em Ciências Histórico-Jurídicas pela mesma instituição. Doutorou-se, em 1986, em História pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa (UNL) com a tese “As Vésperas do Leviathan. Instituições e Poder Político em Portugal no século XVIII”, que versou sobre o sistema de poderes das monarquias tradicionais europeias. A obra tornou-se marco da historiografia lusófona, sendo importante contributo para a compreensão das sociedades portuguesa e brasileira do período.

 

Ainda sobre o resultado de pesquisas de Hespanha, o português publicou cerca de duas dezenas de livros e quase duzentos artigos acadêmicos em Portugal e no exterior. Entre suas realizações mais recentes, publicou o livro "Filhos da Terra, Identidades Mestiças nos Confins da Expansão", no qual retoma temas da história colonial. O Centro de Investigação e Desenvolvimento sobre Direito e Sociedade (CEDIS) da Universidade Nova de Lisboa o definiu como "o historiador português mais citado internacionalmente" e "um dos nomes mais importantes no estudo da história institucional e política dos países ibéricos".

 

Também como pesquisador pertenceu a diversos grupos e instituições de pesquisa em Portugal e em outros países. Como exemplo, no Brasil, era membro do Antigo Regime nos Trópicos (ART), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Também ao longo de sua trajetória esteve vinculado ao Instituto de Ciências Sociais da Universidade Nova de Lisboa (1989-2003), onde, concomitantemente, desempenhava a docência universitária. 

 

Como professor visitante passou pela Ecole des Hautes Études en Sciences Sociales (EHESS), Yale, University of California/Berkeley, Universidad Autónoma de Madrid (UAM), University of Macau, Universidade Agostinho Neto (UAN) e o Instituto Superior de Ciências e Tecnologia de Moçambique (ISCTEM), dentre outras. Na América Latina, foi visitante da Universidad Nacional de Quilmes, na Argentina, da Escuela Libre de Derecho, no México, e do Instituto de Estudos Brasileiros, da Universidade de São Paulo.

 

Fundou e compôs os quadros das revistas acadêmicas Penélope, em Portugal, e Themis, em Porto Alegre, e fez parte do corpo editorial de muitos outros periódicos, como a Tempo (Universidade Federal Fluminense), Almanack Braziliense (Universidade de São Paulo) e E-journal for Portuguese Studies (Brown University). Entre 1995 e 1998, dirigiu a Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses.

 

A receber o título de Doutor Honoris Causa na UFPR/fonte: Flickr UFPR.

A receber o título de Doutor Honoris Causa na UFPR/fonte: Flickr UFPR.

O reconhecimento de sua atuação o fez receber vários prêmios e títulos, como dois doutoramentos Honoris Causa. O primeiro, na Universidade de Lucerna (Suiça), e o segundo, na Universidade Federal do Paraná. Também era membro correspondente estrangeiro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHBG), situado no Rio de Janeiro, e do Instituto de Investigaciones de Historia del Derecho, em Buenos Aires. Era Grande Oficial da Ordem de Cristo, título dado pela Presidência da 

                                                 República Portuguesa.

 

 

Repercussão

O óbito de Hespanha repercutiu dos dois lados do Atlântico. Os principais jornais portugueses noticiaram a perda do pesquisador. João Cravinho, ministro da Defesa de Portugal, em sua conta no Twitter, postou que “A melhor homenagem possível é a leitura da sua obra. Estou a meio de ”Filhos da Terra”, recentemente publicado, que rasga horizontes novos para a historiografia de Portugal no mundo”. António Costa Pinto, professor e pesquisador do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, postou em sua conta no Facebook que a produção acadêmica de Hespanha teve "grande impacto na Alemanha, Europa do Sul e América Latina." Na mesma rede social, o Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa afirmou que "estamos de luto com a partida do Prof. António Manuel Hespanha (1945-2019)".

 

No Brasil, o grupo de pesquisa Antigo Regime nos Trópicos emitiu a seguinte nota, em que afirma que “lamenta profundamente o falecimento do Professor António Manuel de Hespanha, um dos maiores modernistas dos últimos anos e uma das principais referências para estudiosos dos mundos ibéricos da época moderna, inclusas as áreas de conquista da América lusa. Recentemente, finalizamos a organização de um seminário interno do ART, a se realizar entre os dias 28 e 30 de agosto de 2019. Em razão de seu falecimento e por sua vasta e marcante obra, o seminário será dedicado à sua memória. Igualmente, dividimos nosso pesar com colegas de trabalho no Brasil e de outras partes do mundo, sobretudos historiadores modernistas portugueses. Damos, igualmente, pêsames aos familiares de António Manuel de Hespanha”.

 

Releia entrevista que o professor catedrático da Universidade Nova de Lisboa concedeu à Revista Tema Livre clicando aqui.

 

António Manuel Hespanha: conferencista no XXII Simpósio da Anpuh/Acervo Revista Tema Livre.

António Manuel Hespanha: conferencista no XXII Simpósio da Anpuh/Acervo Revista Tema Livre.

 

 

 

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Historiador José Murilo de Carvalho recebe título de Doutor Honoris Causa na Universidade de Coimbra.

Niterói, quarta-feira, 28 de janeiro de 2015.

Da Redação 


O historiador José Murilo de Carvalho na cerimônia em salão da Universidade de Coimbra.

 <center>Os historiadores José Murilo de Carvalho (UFRJ/ABL) e Fernando Catroga (UC) no início da cerimônia que conferiu ao brasileiro o título de Doutor Honoris Causa.</center>

 

O historiador José Murilo de Carvalho recebeu, hoje, 28 de janeiro de 2015, o título de doutor honoris causa em Letras na Universidade de Coimbra (UC). A cerimónia ocorreu na Sala dos Capelos, a partir das 10:00h (horário local). O novo doutor teve como apresentante o Prof. Dr. Carlos Reis (UC) e os elogios feitos pelos Prof. Dr. Fernando Catroga (UC/elogio do doutorando) e Prof. Dr. José Augusto Bernardes (UC/elogio do apresentante). Destaca-se que o evento marca a abertura da comemoração dos 725 anos da UC e, ainda, que amanhã, 29 de janeiro, José Murilo de Carvalho vai realizar na instituição lusa a conferência "a Universidade de Coimbra e a História do Brasil".

Intelectuais da UC a participarem da cerimônia.

Intelectuais da UC a participarem da cerimônia.

 

Um dos poucos intelectuais brasileiros que concilia cadeiras na Academia Brasileira de Letras e na Academia Brasileira de Ciências, José Murilo de Carvalho é, segundo o reitor da UC, provavelmente, o maior historiador brasileiro vivo, uma das razões para o pesquisador brasileiro ser laureado pela universidade portuguesa. Outro motivo é o vínculo da obra intitulada "A construção da ordem – teatro da sombra" com a UC. Neste trabalho, José Murilo de Carvalho apontou que os responsáveis pela independência do Brasil, bem como aqueles que seguiram na administração imperial, eram, na sua maioria, formados na UC, permitindo que os segmentos dominantes do Brasil tivessem um projeto semelhante para a nação que estava a formar-se. Evitava-se, então, que o Brasil se fragmentasse, como ocorria, concomitantemente, com os domínios de Madrid nas Américas.

José Murilo de Carvalho na "Sala dos Capelos", que concentrou boa parte do evento.

José Murilo de Carvalho na "Sala dos Capelos", que concentrou boa parte do evento.

 

José Murilo de Carvalho
Conhecido publicamente nos meios intelectuais brasileiros e estrangeiros, José Murilo de Carvalho foi, desde 1997, professor do Instituto de História (IH) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), sendo hoje professor emérito da referida autarquia. O historiador obteve seu mestrado e seu doutorado, respectivamente, em 1968 e 1975, em Standford, EUA. Também nesta instituição norte-americana, José Murilo de Carvalho realizou o seu primeiro pós-doutorado (1976-77). O segundo foi na Universidade de Londres (1977). Além disto, como professor visitante, o pesquisador passou por diversas universidades, como as de Leiden (Holanda), Oxford (Inglaterra), Irvine (California, EUA) e pela Ecole des Hautes Études en Sciences Sociales (França).

José Murilo de Carvalho e José Pedro Paiva, diretor da Faculdade de Letras da UC.

José Murilo de Carvalho e José Pedro Paiva, diretor da Faculdade de Letras da UC.

 

Dentre os livros que escreveu individualmente, somados aos que organizou e participou com capítulos, vários deles tiveram edições no exterior ou reedições no Brasi, a totalizar, assim, esta soma, mais de 100 livros editados. Pode-se encontrar, portanto, ao menos parte da obra de José Murilo de Carvalho em outros idiomas que não sejam o português, como, por exemplo, o inglês, o francês e o espanhol.

Ao centro, José Murilo. À direita do historiador, o Prof. Dr. José Augusto Bernardes (reitor da UC) e, à esquerda, José Pedro Paiva (diretor da Faculdade de Letras)

Ao centro, José Murilo. À direita do historiador, o Prof. Dr. José Augusto Bernardes (reitor da UC) e, à esquerda, José Pedro Paiva (diretor da Faculdade de Letras)

 

Sobre os vários prêmios e títulos recebidos, o historiador ganhou, duas vezes, o Jabuti (1991 e 2008), principal prêmio literário do Brasil e, uma vez, o Casa de las Américas, em Cuba (2004), em virtude do livro "Cidadania no Brasil: o longo caminho". Recebeu, ainda, o título de pesquisador emérito do CNPq (2008) e foi classificado pelos jornais "O Globo" (2006) e "Jornal do Brasil" (1989), respectivamente, como um dos "100 brasileiros geniais" e "Homem de Idéias". Ao seu vasto currículo, José Murilo de Carvalho agrega duas comendas: medalha de Oficial e Comendador da Ordem de Rio Branco, do Itamarati (1989), e a Grã-Cruz da Ordem Nacional do Mérito Científico, dado pela presidência da República (1998).

 


Acervo Tema Livre 

Para reler entrevista do Prof. Dr. José Murilo de Carvalho concedida à Revista Tema Livre, clique aqui.
  

Para rever a posse do historiador José Murilo de Carvalho na ABL, clique na foto abaixo.

 

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EDUFF tem novo diretor, o historiador Aníbal Bragança


Niterói, quinta-feira, 08 de janeiro de 2015.

Professor e pesquisador da UFF por praticamente 30 anos, o historiador portugués está à frente da editora universitária.

Professor e pesquisador da UFF por praticamente 30 anos, o historiador portugués está à frente da editora universitária.

Bacharel em História pela Universidade Federal Fluminense (UFF), mestre e doutor em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo (USP), Aníbal Bragança foi nomeado, no último dia 7, pelo reitor Sidney Mello, novo diretor da Eduff.
Professor Associado da UFF até o julho de 2014, quando aposentou-se, Aníbal Bragança exerceu a docência e a pesquisa na instituição fluminense durante 29 anos, desenvolvendo investigações no campo do livro e da leitura. O historiador é autor de obras como "Livraria Ideal, do cordel à bibliofilia" (EdUSP, 2009) e co-organizador, dentre outros, do livro "Impresso no Brasil, dois séculos de livros brasileiros" (Edunesp, 2010), que recebeu o Prêmio Jabuti de melhor livro do ano na área de Comunicação.
A aproveitar o ensejo, convidamos os amigos a relerem a entrevista concedida pelo Prof. Dr. Aníbal Bragança à Revista Tema Livre:
www.revistatemalivre.com/anibal12.html

 

 

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História de luto: faleceu, na tarde de hoje, o historiador Ciro Flamarion Cardoso

Niterói, 29 de junho de 2013

Na tarde deste sábado, 29 de junho, faleceu, aos 70 anos, um dos maiores historiadores brasileiros, o Prof. Dr. Ciro Flamarion Cardoso, Titular de História Antiga e Medieval do Departamento de História da Universidade Federal Fluminense (UFF). 

Ciro nasceu em Goiânia, em 1942. Graduou-se em História pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), em 1965, e doutorou-se na mesma área na Université de Paris X, Nanterre, em 1971. Realizou seu Pós-Doutorado na New York University, em 1984. 

Além disto, ao longo de sua trajetória, acumulou prêmios, publicou/organizou mais de 40 livros, formou doutores e foi professor da UFRJ, da PUC-Rio e de instituições na França e no México. À trajetória de Ciro agrega-se o desenvolvimento de pesquisas concernentes à Metodologia de Pesquisa Científica, à ocupação joanina da Guiana Francesa, à escravidão na América e ao Egito Antigo, tema ao qual dedicava-se nos últimos anos. 

O velório de Ciro será no domingo, 30 de junho, das 10 às 14h na capela 1 do Parque da Colina, em Pendotiba, Niterói. 

 

 

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O juiz William Douglas torna-se membro da Academia Niteroiense de Letras


Niterói, 24 de abril de 2013

 

William Douglas: cadeira nº 40 da Academia Niteroiense de Letras.

William Douglas: cadeira nº 40 da Academia Niteroiense de Letras.

 

Tomou posse hoje, 24 de abril de 2013, na Academia Niteroiense de Letras (ANL), o juiz federal, professor universitário, pastor evangélico e escritor, William Douglas. O intelectual fluminense passou a ocupar a cadeira nº 40, que tem como patrono o advogado, jornalista e político paulista Alfredo Gustavo Pujol. O evento ocorreu no final da tarde no auditório nobre da OAB/Niterói.
Ex-aluno da UFF (Universidade Federal Fluminense), resumidamente, pode-se expor que William Douglas foi o 1° colocado nos concursos para juiz, defensor público e delegado de Polícia/RJ, autor de diversos livros de sucesso e da tese “Manutenção do Valor Real do Benefício Previdenciário” – indicamos, ainda, o blog do novo membro da ANL, onde é possível realizar download de material: http://www.blogwilliamdouglas.blogspot.com.br

Abaixo, parte do discurso de William Douglas.
A Academia tem por fim, segundo os seus estatutos, a “cultura da língua nacional”, sendo composta por membros efetivos e perpétuos, conhecidos como “imortais”, À semelhança da Academia francesa, o cargo de “imortal” é vitalício, o que é expresso pelo lema “Ad immortalitem”, e a sucessão dá-se apenas pela morte do ocupante da cadeira. Como diz texto da ALCEAR Academia de Letras, Ciências e Artes do Amazonas “a Academia pretende resguardar e manter o brilho das Letras, que jamais se poderá apagar; a verdade das Ciências, que identifica soluções para as indagações e angústias da Humanidade; e a beleza das Artes, eternizada desde o momento da Criação, quando Deus ordenou: Faça-se a Luz! É nessa tríade universal que a inteligência, a criatividade e o conhecimento do Homem se fazem imortais.”

 

 

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Prof. Dr. Manolo Garcia Florentino é nomeado presidente da Fundação Casa de Rui Barbosa (FCRB)

Niterói, 27 de fevereiro de 2013

Manolo Garcia Florentino, docente e pesquisador do Instituto de História (IH) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e do Programa de Pós-Graduação em História Social (PPGHIS) desta instituição, teve publicada ontem, no "Diário Oficial da União", sua nomeação para a presidência da FCRB. Manolo assume o cargo em substituição a Helio Portocarrero, que o ocupava, interinamente, desde que o Prof. Dr. Wanderley Guilherme dos Santos, cientista político, pediu sua exoneração, no dia 30 do mês passado. 

 

O Prof. Dr. Manolo Garcia Florentino, historiador da UFRJ.

O Prof. Dr. Manolo Garcia Florentino, historiador da UFRJ.

 

A partir de agora, Manolo dirige a Fundação, que é ligada ao Ministério da Cultura. A FCRB é polo de referência nacional no campo da preservação da memória e da produção do conhecimento, além de ser lócus de reflexão e debate da cultura brasileira. 

 

Parte da construção da Casa de Rui Barbosa, situada em Botafogo, no Rio.

 Prédio histórico: foto de parte da fachada da Casa de Rui Barbosa, situada em Botafogo, no Rio.

 

 

O novo presidente da FCRB é dono de um currículo notório. Dentre suas diversas realizações no campo da História, Manolo Florentino é autor de clássicos da historiografia brasileira, como, por exemplo, "Em Costas Negras: Uma História do Tráfico entre A África e o Rio de Janeiro, Séculos XVII e XIX" e "O Arcaismo Como Projeto", sendo que, neste último, Manolo divide a autoria com o Prof. Dr. João Fragoso, também do IH/UFRJ. Em 2009, Manolo recebeu da Presidência da República (Ministério da Ciência e Tecnologia) a Comenda da Ordem Nacional do Mérito Científico. À função de pesquisador, Manolo também acumula experiência administrativa, pois foi, de 2006 a 2010, coordenador do PPGHIS. 

 

Fundação Casa de Rui Barbosa 
Rua São Clemente 134, Botafogo, Rio de Janeiro
Telefone 55.21.3289-4600 

 

 

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Historiadora vira nome de rua no Rio de Janeiro

Niterói, 14 de julho de 2011 

Eulália Maria Lahmeyer Lobo (Rio de Janeiro, 1924 - Rio de Janeiro, 31 de maio de 2011): primeira mulher a doutorar-se em História no país foi professora da UFF e da UFRJ.

Eulália Maria Lahmeyer Lobo (Rio de Janeiro, 1924 – Rio de Janeiro, 31 de maio de 2011): primeira mulher a doutorar-se em História no país foi professora da UFF e da UFRJ.

Da Redação 

Por decreto da prefeitura do Rio de Janeiro, sancionado no último dia 11, a historiadora Eulália Maria Lahmeyer Lobo tornou-se nome de rua na cidade maravilhosa. A homenagem à historiadora carioca, que faleceu no último dia 01 de junho no Rio, recaiu na antiga Rua 63 no bairro de Pedra de Guaratiba, na Zona Oeste. 

Pioneirismo e perseguição política 

Eulália Lobo foi a primeira mulher a defender uma Tese de Doutorado em História do Brasil. Além disto, no período do regime militar, a historiadora foi aposentada compulsoriamente, sendo, assim, desligada do IFCS [à época, unidade da UFRJ referente aos cursos de História, Filosofia e Ciências Sociais] e até mesmo presa por um curto período. 

Com a Anistia, Eulália Lobo foi trabalhar na UFF, alcançando, posteriormente, nesta instituição e na UFRJ, a condição de professora emérita. 

 

 

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Ensino e vivências: as apreensões da história local no cotidiano da sala de aula

Texto de Anderson Fabrício Moreira Mendes

“É o saber da História como possibilidade e não como determinação. O mundo não é. O mundo está sendo. Como subjetividade curiosa, inteligente, interferidora na objetividade com que dialeticamente me relaciono, meu papel no mundo não é só o de quem constata o que ocorre, mas também o de quem intervém como sujeito de ocorrências. Não sou apenas objeto da História, mas seu sujeito igualmente. No mundo da História, da cultura, da política, constato não para me adaptar,mas para mudar”1.

Diante das adversidades que a educação tem enfrentado, a construção de um conhecimento dinâmico e motivador torna-se um desafio cada vez maior, porém, jamais intransponível. No que diz respeito ao ensino de história, uma das perguntas mais recorrentes entre os alunos é: para que estudar história? Essa questão, aparentemente simples, tem as suas raízes fincadas na universidade, onde os debates historiográficos, propulsores de novos conceitos, lançam nas mãos dos novos e inexperientes professores uma vasta gama de conhecimentos que se chocam com a realidade do ensino fundamental e médio.

As contradições entre teoria e prática, discurso e realidade levam o professor de história a se indagar sobre o seu papel em sala de aula e como fazer com que os conteúdos de sua matéria não sejam estranhos e distantes do mundo do aluno. A produção acadêmica desvinculada do ensino, o ambiente escolar, ainda com um arcabouço arcaico, o vasto conteúdo programático baseado em uma historiografia tradicional são problemas apontados pelos professores. Como, então, o ensino de história pode despertar e estimular o aluno?

Em meio a essas dificuldades na estrutura educacional vigente é preciso encontrar novos caminhos, que não seja o de uma adesão acrítica à ideologia neoliberal/conservadora, que impõe um ensino reprodutivista, onde “a história serve de legitimadora e justificadora do projeto político de dominação burguesa””2. Nem tampouco, limitar-se ao meio acadêmico como único centro de produção do conhecimento, instaurando dessa forma “a lógica do produto (o Grande Livro de História) e o monopólio da produção (os Grandes Historiadores) contra a possibilidade de o ensino de História ensejar a universalização dos produtores e o diálogo entre diferentes produções”.3

Na última década, alguns avanços são percebidos, na tentativa de elaborar propostas que articulem questões atuais ao conteúdo tradicional, a produção acadêmica interagindo com a sociedade, apreendendo e dialogando com o saber dos desconhecidos, aprendendo com suas vivências. Projetos que:

a. Pensam a escola como um espaço de renovação, o lugar onde tradições e idéias, possam ser discutidas e não simplesmente reproduzidas, buscando, por exemplo, na realidade dos alunos a própria experiência de classe, historicizando os conflitos, mostrando que os estudantes, como sujeitos ativos e não passivos da história, estão inseridos nesse debate e podem mudar e transformar a sua realidade;

b. Enxergam o professor como sujeito de seu tempo, capaz de apreender e criticar, individual ou coletivamente a sociedade em que se insere, propondo transformá-la, efetivamente, através de propostas político-pedagógicas e a partir da escola..4

Um conhecimento revolucionário, aberto ao novo, porque suas esperanças e expectativas não estão fundamentadas em um discurso utópico, distante do mundo concreto, mas na capacidade do ser humano que reflete sobre a sua própria limitação e é capaz de se libertar, através do exercício da ação modificadora da realidade, rompendo com o discurso conformista. Um “educar” comprometido com a formação de um Ser humano que não espera acontecer, cair do céu, “mas porque sabe, faz a hora” , a sua vez, como voz ativa na construção de um discurso contra hegemônico. O ensino de uma história viva e transformadora!

A história local, trazendo à tona acontecimentos, atores e lugares comuns ao estudante faz com que este se aproxime da disciplina, percebendo a relação dialética entre o passado desconhecido e o presente, tão próximo. Pode-se, a partir desse ponto, estabelecer uma problematização que estimule o aluno a sair da curiosidade ingênua, conduzindo-o a um conhecimento crítico da realidade, contribuindo para a construção de sua consciência histórica e o amadurecimento de sua cidadania.

O interesse pela história local surgiu a partir do curso de História Oral que fiz na Universidade Federal Fluminense, quando estava na graduação em 2002. Sob a orientação dos professores Ismênia de Lima Martins, Hebe Mattos e Paulo Knauss, trabalhei no levantamento histórico do bairro de São Lourenço, do século XVI aos dias atuais, através das fontes secundárias, com documentos do período colonial e imperial. E em um segundo momento, no 2º semestre de 2003, na condição de monitor de pesquisa das professoras Hebe de Mattos e Ismênia de Lima Martins, nas entrevistas com os moradores do Outeiro de São Lourenço, juntamente com os demais colegas da turma, o que proporcionou a produção de um material que tornou-se a base empírica da minha monografia de bacharelado.

 

O LOCAL E A CIDADE: SÃO LOURENÇO DOS ÍNDIOS E NITERÓI

Visto como primeiro núcleo de povoamento da região, surgido no período da expulsão dos franceses da Baía de Guanabara, no século XVI, o aldeamento de São Lourenço foi tornando-se cada vez mais, ao longo do desenvolvimento da região, um espaço marginal, insalubre e distante dos ideais de urbanização. Por seus problemas geográficos – um morro cercado por um mangue – e por questões sociais – área de índios, tornou-se uma região distante dos ideais europeus trazidos pela corte portuguesa, no século XIX, que influenciaram na disciplinarização do espaço e normas de convívio social5. Quando, em 1819, foi criada a Vila Real da Praia Grande, o plano de urbanização proposto não apresentava nenhuma continuidade territorial com a antiga aldeia de São Lourenço.

O bairro só sairá do anonimato, passando a fazer parte da história da “heróica e virtuosa cidade” , nas primeiras décadas do século XX, com as obras de urbanização da cidade, o aterro do mangue, o processo de tombamento da igreja de São Lourenço dos Índios, a discussão em torno da figura de Araribóia e a inserção, no calendário da cidade, da missa em comemoração a fundação de Niterói, celebrada naquela capela. Contudo, o reaparecimento do bairro revela o fim de um espaço indígena, logo, uma área ocupada por novos atores, imigrantes portugueses e espanhóis, em sua maioria, além de migrantes do interior do Estado e descendentes de escravos, que constroem uma nova relação com o espaço.

Ao abordar a história de São Lourenço, partindo de uma visão mais global, inserindo-a no contexto nacional e regional, a memória emerge como fio condutor, dando sentido aos acontecimentos históricos, encadeados nas páginas da municipalidade e no discurso dos desconhecidos moradores do outeiro.

O discurso oficial, construído pela municipalidade, conferiu à imagem do chefe terminó e sua aldeia um papel embrionário na construção da cidade. A imponente estátua no centro da cidade e o busto na praça do outeiro são pontos de contato que adquirem na memória consagrada uma simbologia rica, contudo, distante de uma cronologia exata e arraigada em um tempo mítico. Mito político que reconstrói a narrativa histórica de forma criativa, reestruturando o seu sentido, sendo um instrumento importante para consciência social. Não só Niterói elabora sua identidade, a partir das gloriosas vitórias dos terminós, liderados por seu bravo guerreiro, em apoio à causa do valente Capitão Estácio de Sá, mas expande-se, ao exalar na atmosfera nacional a conquista e consolidação do território para metrópole portuguesa, fincando em solo nativo as marcas da civilização européia, anunciando um novo tempo. Tempo que Niterói reivindica para si, como herdeira do notável passado, que se re-atualiza na história da profícua cidade, com olhar atento para o progresso. Espraia-se também no cotidiano dos anônimos de São Lourenço, na valorização do Morro, através do discurso histórico, que estes utilizam ao reclamarem as melhoras no seu espaço. Essa imaginária “organiza simbolicamente o tempo histórico dos homens da cidade, presentificando o passado, sacralizando-o em bases afetivas e inscrevendo-o na paisagem”6.

Núcleo de povoamento, baluarte de defesa da Guanabara, Vila Real, Cidade Imperial, Capital da Província, Cidade Invicta, Cidade Sorriso, “quarta cidade em qualidade de vida do Brasil” , Niterói, ao longo da história, passa por várias transformações – urbanas, econômicas, políticas e sociais – diversificando o seu espaço. Nesse processo, a cidade ideal esbarra nas contradições do mundo real: os problemas físicos que procuraram ser erradicados pelo saber médico-higienista e engenheiro-urbanista, buscando mudar a paisagem insalubre; o impacto da Revolta da Armada (1893) e da Revolta Popular – o famoso quebra-quebra das barcas (1959) – na estrutura urbana; os traumas causados pelas tragédias públicas, sendo o incêndio do circo (1961) o mais doloroso para a cidade. Todavia, o discurso do “progresso” maquila essa complexidade, configurada no espaço múltiplo, estruturando e reestruturando uma memória oficial que valoriza a cidade moderna, ancorada no virtuoso passado, imortalizado nos lugares de memória. Cidade de identidade plural, percebida pelo exame cuidadoso do imaginário urbano – fio simbólico que une e dá forma ao tecido das representações e dos significados ao longo de sua história.

 

OS ANÔNIMOS CONTAM A HISTÓRIA

A memória oficial, construída ao longo da história da cidade de Niterói, vinculando o espaço do morro de São Lourenço, no universo da imaginária urbana, não é rejeitada ou refutada pelos moradores do local, ao contrário, reforça a identidade comunitária, que se apropria desta, projetando o outeiro para além de suas fronteiras naturais, definidas e reafirmadas, em relação ao morro da Boa Vista e a favela do Sabão, comunidades inseridas dentro do mesmo bairro. A comunidade residente no outeiro, consciente da historicidade do espaço, diferencia-se das demais, tidas como espaços marginais e destituídas do mesmo significado histórico. O grandioso passado reveste o território de uma rica simbologia, revelando uma dimensão mítica, que não falseia ou inventa os acontecimentos, todavia torna-os emblemáticos, ampliando o seu significado. Vincula-se, dessa forma, o local, ao regional e ao nacional.

Vivências e experiências relatadas no cotidiano associam as representações do passado com a dinâmica do presente, relacionando dialeticamente o anterior, o tempo de Araribóia e o posterior, o tempo atual dos orgulhosos moradores locais. O projeto7 apreendido na construção dessa memória coletiva usa a lembrança das virtuosas batalhas indígenas, aspecto desbravador do aldeamento e os vestígios materiais desse outro tempo, esquecendo-se, contudo, de qualquer outra ligação com essa cultura do passado. Da mesma forma a cidade usa a figura de Araribóia para projetar-se na conjuntura nacional, contudo, o outeiro no dia a dia da Niterói do futuro, é colocado na galeria de um longínquo passado, distanciado e inscrito nas empoeiradas páginas das efemérides da cidade. Páginas remexidas e sacudidas pela voz da comunidade que re-atualiza a memória, ritualizada na Festa de São Lourenço, festa popular e religiosa realizada pela comunidade no dia 10 de agosto, e a Festa de Fundação da Cidade, promovida pela prefeitura no dia 22 de novembro, que marcam a especificidade desse pitoresco espaço8.

 

A HISTÓRIA LOCAL NO COTIDIANO ESCOLAR: SÃO LOURENÇO E O COLÉGIO ESTADUAL BRIGADEIRO CASTRIOTO

Entender a história do bairro e da cidade através dos personagens vivos e ativos da comunidade faz com que a análise historiográfica esteja aberta às experiências humanas e as transformações sociais sejam apreendidas com mais profundidade. Da mesma forma, a vivência dos alunos no cotidiano da sala de aula, atualiza o debate histórico. Por isso, nada mais propício do que trabalhar a história do bairro em um colégio da rede estadual, nele inserido. O CEBRIC (Colégio Estadual Brigadeiro Castrioto), estabelecido no bairro desde a década de 1970, atualmente, procura se adequar aos parâmetros curriculares, mas depara-se com algumas dificuldades. Uma das diretoras, Sônia Regina Fontes Coutinho, ocupando esta função há oito anos, traça um perfil do ambiente escolar ressaltando os seguintes pontos:

a. Uma grande parte do corpo discente é composta por moradores de fora da comunidade, muitos, inclusive de São Gonçalo;

b. A maioria dos alunos, principalmente na última década, vem de escolas municipais, que têm o sistema de aprovação automática, fazendo com que os estudantes matriculados na 5ª série do Ensino Fundamental e no 1º ano do Ensino Médio, essas séries em especial, apresentem uma grande dificuldade de aprendizado na leitura e na escrita. O perfil desse aluno leva o colégio a buscar um caminho intermediário, onde haja uma adaptação de ambos os lados, o que muita das vezes faz com que a qualidade do ensino fique prejudicada. As professoras de História Claudia Maria Correia e Estela Ferreira Faria também destacam um desinteresse geral dos estudantes, o que a diretora encara como uma auto-estima muito baixa.

c. Uma grande parte dos professores, antigos na escola, utilizam um sistema tradicional de avaliação que não se adequa a realidade do aluno. O processo de aprendizagem fica comprometido, pois os educadores não conseguem atualizar-se, devido à pesada carga horária e a omissão do próprio Estado, na concretização de políticas que promovam cursos de especialização. Quando conseguem fazer algum curso, se deparam com a inviabilidade de executar seus projetos, entravados pela infraestrutura da escola arcaica e tradicional.

d. Por sua vez, as atividades extraclasses dinamizam a vida escolar. Projetos como a “Escola para além dos muros”. Uma parceria com a Universidade Federal Fluminense, aonde os alunos vão para os Espaço de Ciências e aprendem com os laboratórios e oficinas; “Jovens Talentos” – um convênio com a Fundação CECIERJ (Fundação Centro de Ciências e Educação Superior à Distância do Rio de Janeiro), ligado à FAPERJ (Fundação Carlos Chagas Filho de Ampara à Pesquisa do Rio de Janeiro), onde os melhores alunos do 2º ano do ensino médio são encaminhados para aprender com professores universitários em seus trabalhos de pesquisa. Dentro da escola também funciona uma oficina de reciclagem de papel.

e. Apesar de destacar uma ligação mais estreita com a Universidade Federal Fluminense, a diretora, também professora de história, ressalta que até hoje não conseguiu nenhum contato com o Departamento de História dessa universidade, nenhum projeto e lamenta estar tão próxima de um dos melhores cursos de História do país e não conseguir nenhum benefício para escola nessa área.

Os problemas apontados no cotidiano da escola são comuns a outras realidades espalhadas por todo país. Contudo, o CEBRIC tenta superar as dificuldades investindo em atividades fora da sala de aula, sendo receptivo a qualquer medida que contribua para melhora no ambiente escolar. Logo, o contato com a escola foi extremamente proveitoso. A escola colocou-se à disposição, entendendo a importância da pesquisa e sua relevância para o estudante.

Os professores de história, nas entrevistas, salientaram que por meio do conhecimento da localidade, de um espaço comum aos alunos seria muito mais prático passar os conceitos históricos, pois estes apreenderiam com muito mais facilidade os demais conteúdos da matéria a partir de uma realidade histórica que se aproximasse de seu cotidiano. O estudante a partir de então, veria a sua localidade, ou a localidade onde está situada sua escola, de uma outra forma. Deram sugestões como: trabalhar o material da pesquisa através de resumos de textos em sala de aula, onde os próprios professores, associando a novidade à proposta de uma História Integrada, atuariam com uma dinâmica mais agradável partindo do local ao internacional e vice-versa, como por exemplo, as guerras no Rio de Janeiro para expulsar os franceses – que não se submetiam às regras do Tratado de Tordesilhas – fato que causou a fundação da Aldeia de São Lourenço dos Índios; estimular a interdisciplinaridade por meio de oficinas de teatro; e passeios pelo bairro para melhor apreensão da diversidade cultural e temporal.

A Direção destaca ainda, que o conhecimento histórico da localidade é essencial para levantar a auto-estima desse estudante, tão desestimulado, pois conhecer o seu meio social, também é uma forma de conhecer-se e entender que a sociedade e o homem estão sempre em transformação. Transformação que leva a uma reflexão sobre a realidade atual e que medidas seriam possíveis para mudar e romper com as dificuldades sociais, políticas e econômicas do cotidiano.

O primeiro contato com os alunos foi através de uma palestra, onde a história do bairro foi apresentada de uma forma mais geral. Os alunos foram participativos, debatendo, intervindo, revelando um interesse pelo conteúdo histórico, visto, anteriormente, tão distante e tão estranho. Consciência histórica que se despertou a partir do entendimento da própria história contada pelos moradores do outeiro de São Lourenço. Entende-se, portanto, que o conhecimento histórico não deve ser privilégio dos acadêmicos ou dos professores, mas construído por todos, refletido e estimulado no contexto da sala de aula.

Temas como a colonização do Brasil, a questão indígena, nacionalidade, podem ser trabalhados no dia a dia da sala de aula, em oficinas com jornais, revistas, fontes primárias e imagens. A interdisciplinaridade também está implícita no projeto podendo fazer contato com a Literatura, por meio da história da capela em estilo barroco e do Auto de São Lourenço, através das mudanças no espaço está ligado à Geografia e, até mesmo a biologia por meio do estudo do meio ambiente. Enfim, abre-se um leque de oportunidades para escola, onde o aluno através do conhecimento do seu meio adquire um olhar crítico e uma postura diferente diante dos problemas do bairro que afetam não só a comunidade residente, mas a própria escola.

Estas foram as primeiras atividades do projeto que pretende, acima de tudo, contribuir para o crescimento do aluno enquanto cidadão, entendendo o seu espaço, sua história e colocando-se como um sujeito ativo e participativo, não conformado com a realidade adversa.

Mesmo sendo um exemplo pontual, pode-se perceber as possibilidades de integração universidade-sociedade, através de um curso de História Oral: articula-se com setores da comunidade relativos ao tema de estudo; dá voz aos agentes ignorados pela história oficial; sistematiza esse conhecimento e junto com as demais fontes existentes, problematiza e desenvolve um trabalho de pesquisa; retorna à mesma comunidade, disponibilizando à escola do bairro um material útil e relevante para o ensino da história local, revelando aos estudantes a dinâmica e a diversidade do processo de modificação e estruturação do espaço, que não é dado, mas construído; estimula a comunidade a reivindicar melhoras para o seu espaço; reflete sobre a aplicação do conhecimento no campo do ensino, o que contribui para o amadurecimento da pesquisa; e revela que o ensino da história local, por meio de medidas de amplo alcance, debates e discussões, pode viabilizar medidas pedagógicas que vão além da escola local e do próprio bairro.

Um ensino de história que não se restringe à academia, mas que está aberto ao debate com a sociedade, construindo-se e reconstruindo-se no ambiente escolar, ouvindo o aluno e percebendo o seu meio. Pensando, refletindo, intervindo sem jamais se entregar a um discurso fatalista. História local que não se restringe ao nome de ruas, personagens importantes ou datas comemorativas, mas que insere o aluno em um contexto histórico que lhe é comum, relacionado com toda uma conjuntura nacional e internacional. Aprendendo a partir do que está mais próximo, problematizando situações diárias na vida do estudante e inserindo-as na dinâmica de um contexto histórico mais amplo, o professor consegue não só estimular o aluno a entender a história, vendo a disciplina como algo relevante, mas motiva-o a interagir na construção e elaboração do conhecimento, através do diálogo democrático e de uma ação efetiva que o conduza a conscientização de sua cidadania.

 

NOTAS

01 – FREIRE, Paulo. PEDAGOGIA DA AUTONOMIA. São Paulo, Paz e Terra, 1996, pp. 85,86.

02 – NADDAI, Elza. O Ensino de História e a ‘Pedagogia do Cidadão’. In: O ENSINO DE HISTÓRIA E A CRIAÇÃO DO FATO. São Paulo, Contexto, 2004.

03 – SILVA, Marcos A. Ensino de História, Exclusão Social e Cidadania Cultural – Contra o horror pedagógico. In: A MEMÓRIA DO ENSINO DE HISTÓRIA. Santa Cruz do Sul, EDUNISC/ ANPUH, 2000. p.117.

04 – HELFER, Nadir Emma. A memória do ensino de História. In: A MEMÓRIA DO ENSINO DE HISTÓRIA. Santa Cruz do Sul, EDUNISC/ ANPUH, 2000.

05 – CAMPOS, Maristela Chicharo de. RISCANDO O SOLO.: O PRIMEIRO PLANO DE EDIFICAÇÃO PARA A VILA REAL DA PRAIA GRANDE. Niterói, RJ. Niterói Livros, 1998.

06 – KNAUSS, Paulo. Introdução. In: SORRISO DA CIDADE. SORRISO DA CIDADE – IMAGENS URBANAS E HISTÓRIA POLÍTICA DE NITERÓI. Niterói, RJ. Niterói: Fundação de Arte de Nierói, 2003.p. 11.

07 – VELHO, Gilberto. Memória, Identidade e Projeto. REVISTA TB, nº 95, p. 119-126, out/dez. 1988.

08 – Foram realizadas várias entrevistas com os moradores do Outeiro de São Lourenço no período de dezembro de 2003. Este material está organizado no Laboratório de História Oral e Imagem (LABHOI) da Universidade Federal Fluminense.

 

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Prof. Dr. José Murilo de Carvalho (UFRJ/ABL)

No dia 11 de março de 2004, realizou-se na Academia Brasileira de Letras (ABL) a eleição para a cadeira nº 5 ocupada, até novembro de 2003, pela escritora Rachel de Queiroz. Concorreram o historiador José Murilo de Carvalho, que venceu o pleito com 19 votos, o publicitário e empresário Mauro Salles, que obteve 14, e o jurista Paulo Bonavides, que recebeu 4, sendo a eleição decidida no primeiro escrutínio em menos de 20 minutos. 

José Murilo de Carvalho possui pós-doutorado em duas universidades: na de Stanford, nos Estados Unidos, e na de Londres. Membro da Academia Brasileira de Ciências, o historiador tem uma trajetória profissional em diversas instituições de pesquisa, no Brasil e no exterior, como, por exemplo, na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), na École des Hautes Études em Sciences Sociales, no Instituto de Estudos Avançados de Princeton, e nas Universidades de Londres, Oxford, Stanford, Califórnia (Irvine) e Leiden (Holanda). Atualmente, leciona na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), onde é professor do Departamento de História. 

No que tange a sua obra, José Murilo de Carvalho conta com diversos livros publicados, entre eles “Os bestializados: o Rio de Janeiro e a República que não foi”, “Cidadania no Brasil: o longo caminho”, “A construção da ordem: a elite política imperial”, “A formação das almas: o imaginário da República no Brasil” e “Teatro de sombras: a política imperial”. 

Em janeiro deste ano, o seu trabalho “Cidadania no Brasil” recebeu, em Cuba, o Prêmio Literário Casa das Américas, na categoria literatura brasileira, onde concorreram 82 obras. Entretanto, este não é o único livro de Carvalho a ser premiado. “A formação das almas”, por exemplo, obteve, em 1991, o Prêmio Jabuti, da Câmara Brasileira do Livro. 

Ao longo da sua trajetória profissional, o acadêmico foi agraciado com a Grã-Cruz da Ordem Nacional do Mérito Científico (Presidência da República), Medalha de Honra da Inconfidência e Medalha Santos Dumont (ambas do Governo de Minas Gerais), Medalha de Oficial e Comendador da Ordem de Rio Branco (Itamarati) e Medalha de Honra-UFMG (UFMG). 

A seguir, a entrevista exclusiva que o historiador concedeu à Revista Tema Livre, no dia 18 de março de 2004, na qual o pesquisador e membro da ABL, fala a respeito da sua eleição para a instituição criada por Machado de Assis, da sua trajetória profissional e dos projetos acadêmicos que está a desenvolver. 

 

O historiador José Murilo de Carvalho em sua posse na Academia Brasileira de Letras

Discurso de posse do historiador José Murilo de Carvalho na Academia Brasileira de Letras

 


Revista Tema Livre – O Sr. pode falar um pouco sobre a cadeira nº 5, da ABL, para a qual o Sr. foi eleito? 

José Murilo de Carvalho – A cadeira nº 5 teve como ocupantes pessoas notáveis, o que torna mais fácil o trabalho de lhes fazer o elogio no discurso de posse. Para início de conversa, o patrono é Bernardo Guimarães, autor de “Escrava Isaura”, um excelente tema para analisar. Outro notável ocupante da cadeira foi Oswaldo Cruz, cientista que aliou a temática social, a luta contra as epidemias no Rio de Janeiro, com a ciência. Ele era um cientista, um pesquisador, até certo ponto um homem da Universidade. Manguinhos não era exatamente uma Universidade, mas foi o primeiro grande instituto moderno de pesquisas do Brasil. Toda a minha carreira profissional foi feita dentro da Universidade, de uma instituição de pesquisa e ensino. Outro ocupante importante foi Cândido Mota Filho, que escreveu um livro interessante sobre Alberto Torres e criou o Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB), quando era Ministro da Educação. Finalmente, Rachel de Queiroz, primeira mulher na Academia, excelente escritora, e romancista com temática social vinculada à realidade nordestina, desde seu primeiro livro “O Quinze”. São todas pessoas que honraram a Academia e se salientaram na vida científico-cultural do país. É gratificante ocupar uma cadeira com tais predecessores. 

RTL – Quando vai ser a sua posse na ABL e, também, comente sobre o intercambio que o Sr. pode realizar entre as duas academias, a Brasileira de Letras e a Universitária? 

Carvalho – A data da posse depende do eleito, do tempo que ele requer para preparar o discurso de posse. Em geral, os eleitos tomam posse dentro de três ou quatro meses. Pretendo ater-me a esse prazo e tomar posse em julho ou agosto. A segunda parte da pergunta tem a ver com o intercâmbio entre as duas academias. Como já disse, passei minha vida profissional dentro da Universidade e também pertenço a Academia Brasileira de Ciências. Não vou entrar para a ABL por causa da pompa e circunstância, coisas que não me atraem. O que me atrai é a possibilidade de trabalhar em um ambiente novo, com pessoas diferentes daquelas com as quais convivi até agora. Uma das idéias que tenho, não sei se terei condições de implementá-la, seria aproximar as duas academias, a Universidade e a ABL, somar suas contribuições e seus estilos de produzir conhecimento e cultura. Há algumas áreas que podem servir de contato. Penso, sobretudo, em uma melhor utilização pelos alunos da biblioteca da Academia, que está muito boa, muito modernizada. Penso na possibilidade de publicações conjuntas. Penso ainda na melhor utilização do acervo documental da Academia, que é muito rico, pelos alunos para efeito de feitura de monografias, dissertações e teses. Essa documentação é quase ignorada pela Universidade. O uso desse material para análises acadêmicas permitiria um diálogo interessante entre as duas instituições pela combinação de tipos de abordagens diferentes. 

RTL – O Sr. pode falar da sua trajetória profissional? 

Carvalho – Tenho formação meio anfíbia. Minha formação acadêmica se deu na área de Ciências Sociais, sobretudo da Ciência Política. Minha pesquisa se dá, sobretudo, área da história política e da história social das idéias. Essa mistura incomoda um pouco os defensores de fronteira disciplinares rígidas. A mim não incomoda, porque não vejo problema em combinar as duas coisas. A ciência social serve para melhor trabalhar o lado conceitual que vai servir para melhor costurar a narrativa histórica. A combinação, se bem usada, pode eventualmente gerar maneiras novas de abordar certos problemas, de interpretar evidências. É isso o que tenho feito. Trabalhei em instituições dos dois tipos, na UFMG e no Instituto Universitário de Pesquisa do Rio de Janeiro (IUPERJ), em departamentos de Ciência Política, e na Casa de Rui Barbosa e no CPDOC, que são instituições de pesquisa histórica. Finalmente, vim parar aqui no departamento de história da UFRJ. 

RTL – Finalizando, o Sr. pode falar um pouco da pesquisa que o Sr. está a desenvolver agora? 

Carvalho – Além de um grande projeto coletivo do PRONEX, que abrange a UFRJ, a Fluminense, a UERJ e a UNIRIO, financiado pelo CNPq e pela FAPERJ, que consiste em tentativa de fazer uma grande revisão da historiografia sobre século XIX, o que me ocupa mais no momento é um projeto em colaboração com a professora Lúcia Bastos, da UERJ, e um aluno aqui do doutorado da UFRJ, Marcello Basíle e que conta com o apoio da Biblioteca Nacional. Trata-se do levantamento e publicação do que chamamos de panfletos da independência. Estamos em fase final de levantamento dos panfletos em bibliotecas e coleções do Brasil, Portugal e Estados Unidos. A idéia é publicar esses panfletos em “fac-simile”. Acredito que a publicação será de grande auxílio como instrumento de trabalho para muitos pesquisadores, que não vão precisar mais percorrer essas bibliotecas. Acredito também que a análise dos panfletos permitirá reinterpretar a independência no sentido de ressaltar que, se não houve muita guerra, muito tiro, houve, como disse o autor de um dos panfletos, uma guerra literária muito intensa. O fato indica grande participação não apenas de uma elite, mas de muitas outras pessoas no debate sobre a independência. A independência não foi complô de ninguém, nem da elite, nem da dinastia. Foi algo muito mais amplo em que se envolveram muitas pessoas. Foi um processo mais popular e nacional. 

 

 

 

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Prof. Dr. James Naylor Green (California State University)

A seguir, a entrevista que o brasilianista da California State University James Naylor Green concedeu à Revista Tema Livre, no dia 30 de julho de 2003, durante o XXII Encontro Nacional de História, em João Pessoa, na Paraíba. Na entrevista, o historiador fala da oposição ao regime militar brasileiro nos Estados Unidos, da sua atuação como militante em movimentos contra a Guerra do Vietnã e aos regimes militares latino-americanos, além dos seus trabalhos a respeito da América Latina. 

O brasilianista James N. Green durante a sua conferência no Simpósio.

O brasilianista James N. Green durante a sua conferência no Simpósio.

 

Revista Tema Livre – Primeiramente, qual o tema da sua conferência que será proferida hoje?

James Naylor Green – Eu vou falar sobre a oposição à ditadura militar brasileira, que foi realizada nos Estados Unidos nos anos 60/70. 

RTL – E como ocorreu essa oposição nos Estados Unidos?

Green –Primeiro, houve um contato de um grupo de brasileiros com clérigos e acadêmicos norte-americanos, em 69, pedindo ajuda para denunciar internacionalmente a tortura e a repressão no Brasil. Esses acadêmicos e clérigos montaram um comitê para tentar divulgar informações sobre a situação política no Brasil e enfrentaram um certo boicote, um bloqueio, uma filtração da mídia americana, que realmente não acreditava e não exigia provas da questão da tortura. Então, eles montaram todo um esquema de colocar artigos denunciando as torturas, fazendo outras atividades para romper esse bloqueio da informação da grande mídia norte-americana e, realmente, lograram fazer isso. Hoje à noite vou falar mais sobre a atividade dos brasilianistas, ou seja, os acadêmicos norte-americanos que estudam o Brasil, e que cumpriram um papel fundamental nessas campanhas de denúncia à ditadura militar, apoiando os abaixo-assinados, colocando avisos pagos no “The New York Times” denunciando, por exemplo, a prisão do Caio Prado Junior em 70, ou seja, tentando criar uma nova imagem do Brasil. O Brasil, antigamente, sempre foi visto como país tropical, de carnaval, de Carmem Miranda, dos índios, e essas pessoas tentaram colocar no imaginário americano outro tipo de realidade sobre o que estava acontecendo no Brasil nos anos mais difíceis da ditadura militar. 

RTL – E surtiu efeito?

Green – Eu acho que sim, ou seja, você não vai poder ver um efeito claro, direto, dramático. Mas, por exemplo, houve toda uma preparação, um trabalho, em 70, para influenciar um senador do Congresso Americano, que realizou, em 71, uma CPI sobre o apoio militar do governo americano ao Brasil. Então, esse senador, Franklin Church, realizou essa CPI em maio de 71, onde várias pessoas apresentaram provas da tortura no Brasil, a situação da repressão, etc e tal, onde eles tentaram fazer uma ligação entre a ajuda militar, a polícia, e essa tortura. O que, na verdade, não ficou muito claro porque não tinham acesso à documentação para provar isso naquela época. Mas, de qualquer modo, isso cria todo um impacto político no Congresso, na sociedade, em Washington, onde se realizou essa CPI e aqui no Brasil também. Os militares ficaram muito chateados com essa CPI, achando que era uma intervenção nos assuntos internos do país, mas, no ano seguinte, o governo americano, o senador americano apresenta no Congresso uma lei, que não foi aprovada, rompendo a ajuda militar ao governo brasileiro. Um ano depois, em 73 e, depois, em 74, com a crise do presidente Nixon com os escândalos de Watergate, houve uma mudança da composição do Congresso, e muitos congressistas começaram a apoiar esta medida de tirar a ajuda militar aos governos que estavam violando os direitos humanos. Neste caso, o Brasil foi o exemplo mais claro naquela época, foi alicerce de todo um trabalho posterior, denunciando a repressão no Brasil. E, com o golpe no Chile, em 73, que foi muito dramático e chocante, o trabalho do Brasil se expande para o resto da América Latina, então cresce a solidariedade, os grupos, e as pessoas que estão fazendo este trabalho. 

RTL – Falando sobre o apoio norte-americano ao regime militar brasileiro, como ele ocorreu?

Green – Bom, no primeiro momento, houve um apoio político antes do golpe de 64. Por exemplo, uma coisa clássica e que é chocante, é que o governo americano já estava canalizando milhões e milhões de dólares para a aliança para o progresso, para ajudar programas de desenvolvimento, com a idéia de que era fundamental combater o comunismo com alternativas de desenvolvimento etc e tal. Assim, eles canalizaram esse dinheiro em vários estados do nordeste onde tinham governadores da direita, e eles boicotaram qualquer apoio financeiro aos governos da esquerda, como Miguel Arraes, em Pernambuco, para que esses governadores beneficiados aproveitassem nas campanhas eleitorais, ou seja, um projeto nobre sempre ajuda na divulgação de um candidato para governador. Então, houve uma interferência direta de meter-se em assuntos internos do país nesse sentido, por parte do governo americano, para manipular a situação política no país. Esse é um exemplo. 

Está bem trabalhado o apoio que o governo americano deu imediatamente depois do golpe de 64 ao novo governo, ou seja, reconhecendo os militares antes mesmo do Jango sair do país. João Goulart ainda estava na sua fazenda no sul, o Congresso decreta que ele havia abandonado o seu cargo, mas ele estava ainda no país, já estava se retirando da presidência, e o governo americano Johnson reconhece o novo governo, todo ilegalmente, mas que estava procurando uma aparência de legalidade. Sabemos que, indiretamente, eles deram sinais aos militares que o governo americano ia apoiar o golpe de 64, e mandaram um barco com petróleo, gás e armas, para que se fosse necessário, se estourasse uma guerra civil, apoiar os militares. Neste caso, quer dizer, quando ficou claro que os militares realmente já tinham consolidado o seu controle sobre a situação, eles retiraram esse apoio que estava sendo mandado para o Brasil. 

Depois, eles mandaram milhões e milhões de dólares para apoiar a economia do novo governo, o de Castelo Branco e o começo do de Costa e Silva, que tiveram problemas econômicos sérios, muita inflação, e o governo americano ajudou muito para tentar dar uma estabilidade à economia brasileira, para sustentar o regime militar. E, na verdade, em 68, 69, após o AI-5, eles vacilaram um momento, vamos retirar o nosso apoio a esse governo, mas resolveram, assim, continuar com o reconhecimento diplomático ao governo militar. 

Em 76, 77, um novo discurso, um discurso sobre os direitos humanos, o governo de Jimmy Carter, então esse discurso de Jimmy Carter vem do trabalho que nós, os ativistas, eu era militante deste movimento, fizemos no público americano, que ele vai apropriando para a campanha eleitoral dele, para mostrar que ele é moral, religioso, que Nixon era um corrupto, um cara imoral, então vai ter um novo rumo a política exterior dos Estados Unidos. 

RTL – Conte-nos a sua experiência como ativista.

Green – Pois bem, eu era um jovem ativista, no movimento contra a Guerra do Vietnã, era estudante universitário entre 68 e 72, participava ativamente, fui preso várias vezes nas manifestações em Washington contra a Guerra do Vietnã e, em 70, eu já tinha caracterizado que a próxima intervenção norte-americana talvez fosse na América Latina. Então, eu e um grupo de pessoas começamos a formar um coletivo, um grupo de estudos para estudar a América Latina. Eu fui para o México para aprender espanhol, me interessava muito as condições da América Latina e, justamente, conheci por acaso um brasileiro exilado, Marcos Arruda, que foi torturado, conseguiu asilo nos Estados Unidos, a mãe dele morava lá, e ele conseguiu ficar nos Estados Unidos e organizou um comitê, “Committee Against Repression in Brazil”, Comitê Contra a Repressão no Brasil, que organizou um protesto contra o Médici na Casa Branca, quando ele foi visitá-la em 71. Me integrei neste grupo em 73, e fizemos todo um trabalho sobre Brasil e, após o golpe de 11 de setembro de 1973, sobre a situação no Chile e, depois, na Argentina, Uruguai e no resto da América Latina. 

RTL – Qual foi o impacto na sociedade norte-americana do fim do regime militar?

Green – Na verdade, infelizmente, o público americano desconhece a realidade brasileira, sabe muito pouco, não acompanha… E mesmo os universitários, que tem uma certa educação, não sabem sobre esta realidade, então o trabalho que foi realizado naquele momento, o trabalho que eu faço como presidente da Associação de Estudos Brasileiros, como professor de história do Brasil lá, é difícil, é contra a corrente, porque há pouca informação. O que eles conseguiram naquela época da ditadura foi criar uma segunda imagem do Brasil, além da garota de Ipanema e carnaval, um país de terror, de tortura, então conviviam duas imagens do país entre as pessoas que liam os jornais e prestavam a atenção e lembravam que o Brasil era na América Latina e não na África etc e tal. Então, na verdade, eu acho que foi pouca informação sobre esse processo de queda da ditadura militar, também porque foi um processo muito lento, não houve momentos dramáticos, assim, de mobilizações massivas. Houve as mobilizações pelas diretas, que saíram nos jornais, as pessoas que acompanhavam podiam saber o que estava acontecendo, não houve o impacto, vamos dizer, da Revolução Sandinista, ou da Revolução do Iran, que enfrentaram diretamente os interesses americanos, então, estão sempre nos noticiários, esta é uma diferença grande. País muito importante, enorme, mas 80% da população americana, infelizmente, não sabe que se fala o português no Brasil, por exemplo. 

RTL – Qual a inserção do historiador na sociedade norte-americana?

Green – Na verdade, o historiador não tem um peso como, talvez, os historiadores aqui tenham, no sentido de que um historiador da USP, facilmente possa fazer uma coluna na Folha de São Paulo e ser conhecido, a sua voz ser importante etc e tal. Nos Estados Unidos tem alguns historiadores, intelectuais que são importantes nos meios intelectuais, quando eles falam em uma questão política, eles são ouvidos porque tem um certo prestígio, mas eu acho muito mais dispersa esta influência, este efeito na sociedade. 

RTL – Finalizando, como o Sr. vê a internet como meio de divulgação da história?

Green – Eu, que ensino história, acho fabuloso e ruim ao mesmo tempo. Por exemplo, meus alunos agora não sabem ler livros, eles só lêem a internet, facilmente você dá uma tarefa deles fazerem uma pesquisa e eles vão sugando da internet essa informação, sem reflexão, copiando, é muito complicado controlar isso. Então, tem o acesso imediato à informação, mas não existe uma maneira de avaliar quais fontes são verídicas e tem valor, de outras que são coisas que qualquer pessoa colocou em uma página, você entrou por uma frase, aparece essa página, você vai lendo aquilo e acha que isso tem um valor, um peso importante, então isso é um problema sério. Por outro lado, facilita muito a pesquisa. Por exemplo, eu estava procurando várias pessoas, um padre que foi preso em 68, eu vi o nome dele no “The New York Times”, eu queria entrevistá-lo, e, de repente, através da internet, eu o localizei, fizemos contato e ele foi entrevistado. Então, a possibilidade de contato imediato é fabulosa. Outro exemplo é que existe a possibilidade de um intercâmbio muito mais rico entre historiadores brasileiros e de outros países, então, eu tenho laços enormes com centenas de acadêmicos brasileiros através da internet, então há um intercâmbio muito rico neste sentido. Isto é bom, isto é muito bom! 

 

 


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Prof. Dr. Walter Rela (Universidad Catolica del Uruguay)

O historiador uruguaio Walter Rela, no dia 04 de março de 2004, recebeu a Revista Tema Livre para uma entrevista em seu escritório, em Montevidéu, de onde é possível avistar o rio da Prata, rio este que, às suas margens, durante séculos, ocorreram disputas entre portugueses, espanhóis e brasileiros, um dos temas que o historiador discorre na entrevista concedida. Além disto, o historiador fala-nos a respeito da sua trajetória acadêmica, que inclui passagem pelo Brasil, na então Faculdade Nacional de Filosofia do Rio de Janeiro, e a sua experiência em instituições em países como os EUA e Espanha.

 

O historiador Walter Rela em seu escritório, em Montevidéu.

O historiador Walter Rela em seu escritório, em Montevidéu.

 


Revista Tema Livre – Primeiramente, conte-nos um pouco sobre a sua trajetória acadêmica.

Walter Rela – Em primeiro lugar, gostaria de expressar a minha gratidão por este convite, amo muito o Brasil, é a minha segunda pátria, inclusive, a minha avó era brasileira, fazendeira de San Pedrito, no Rio Grande do Sul, de modo que tenho sangue brasileiro, ademais, tenho netos que são brasileiros, então tenho motivos… 

Bem, a minha formação na primeira fase foi no Brasil. Em 1956, tive uma beca do Itamarati para investigação em história, aí a minha ligação com o poeta Manuel Bandeira, que foi um dos meus maiores amigos. Estudei na Faculdade Nacional de Filosofia do Rio de Janeiro, na velha Faculdade de Filosofia, da rua António Carlos e, depois, lecionei, no ano seguinte, na Federal do Rio de Janeiro. 

Depois, fui para a Argentina, me vinculei com a Universidad de Buenos Aires, com a Universidad Católica, lecionei aqui em Montevidéu e, em 1977, comecei a lecionar nos Estados Unidos. Recebi um convite da Washington University, St Louis Missouri, Michigan, e comecei a minha carreira nos Estados Unidos, como professor de letras. Daí, segui até 1992, quando me retirei da Georgetown University, uma das maiores e mais prestigiosas universidades americanas. Durante dez anos lecionei na Universidade de Michigan, lecionei na Universidade de New York, onde no ano passado me fizeram, no 61º congresso anual, uma homenagem à minha obra, que vai ser publicado agora na Revista que saí em 2004, e fui muito feliz. Foi uma etapa de muita felicidade para mim, lecionar e receber o apoio dos alunos, dos colegas, dos professores… Trabalhei muito, porque não há melhor coisa que ter paixão pelo que se faz. Uma vida dura, mas cheia de gratidão, tu vistes aí meus diplomas, meu reconhecimento, fundei academias, como a Academia Uruguaya de Historia Marítima y Fluvial, que é uma das mais importantes academias do Uruguai, que se dedica à história do rio da Prata… 

Bom, em 1988, o governo espanhol, estando eu lecionando em Washington D.C., me convidou para as homenagens do bicentenário do Rei Carlos III. Fui para uma semana e fiquei por muito tempo! Como se passa sempre! Gostei, gostaram das minhas aulas, e comecei a trabalhar em história e a pesquisar. A ir a Lisboa, ao Rio de Janeiro, e tudo isso… E sempre estive no tema do rio da Prata, ou seja, de 1988 até agora, só faço trabalho sobre o rio da Prata. Colônia do Sacramento, a presença portuguesa primeiro e a brasileira depois, Espanha… Preparei muitos trabalhos, publiquei muitas coisas, que tenho o grande prazer em dar-te como presente por tua visita e, bom, uma vida de muito trabalho e de muita satisfação. Sempre muita satisfação. Acho que a maior missão que um homem pode receber neste mundo é a virtude do trabalho, da honra, da dignidade, é uma prenda ao longo do tempo. Dignidade. Com dignidade sempre, uma linha de conduta irreprochável, que ninguém tenha que fazer objeções a tua obra, a tua pessoa, é ótimo. 

Aqui no Uruguai, eu fui um dos fundadores da Universidad Católica del Uruguay, comecei quando era um antigo instituto de filologia, história e letras, depois fui diretor ou decano da faculdade de filosofia e letras por dois anos e, depois, por razões de idade e por regulamentos que existe no Uruguai, tive que me retirar da carreira. Tu sabes, o mesmo ocorre no Brasil, enfim, nos Estados Unidos… 

Agora, tenho 82 anos, sinto um grande prazer em receber-te em minha casa, que é a tua casa e sempre estarei a sua disposição. 

RTL – O Sr. pode falar a respeito das diversas premiações que o Sr. recebeu ao longo da sua carreira?

Rela – Bem, são muitas. Cinqüenta anos dedicados a trabalhos de literatura e de história… Tenho prêmio dado pela Unesco, no ano de 1985, que é o maior prêmio para quem faz dramaturgia. A PUC, em 2001, me fez uma homenagem com motivo de 45 anos de dedicação ao trabalho com eles; a Universidad de Buenos Aires…; o 5º centenário, em Espanha, me premiam com uma obra sobre viajantes marinos e naturalistas no rio da Prata… Sou membro do Círculo de Cultura Pan-Americano, uma das mais importantes organizações hispanista dos Estados Unidos, com assento em Nova Iorque, com assento em Miami, me honro em ter este diploma como membro de honra… Fundador da Academia Uruguaya de Historia Marítima y Fluvial, bem, membro da Academia Carioca, da Academia do Rio Grande de Letras, Membro da Academia Argentina de Letras, e sigo lutando. Sigo lutando com muita paixão, com muito amor pelas coisas e com muito amor pela vida, que é o maior galardão, muito amor pela vida. Bem, esta é a minha vida, tenho 82 anos, estou feliz em conhecer-te, de ver o trabalho da Revista Tema Livre, que acho que é um grande empreendimento, e estou disposto a apoiar. 

RTL – Conte-nos um pouco mais sobre as diversas instituições que o Sr. faz parte, como, por exemplo, a Academia Uruguaya de Historia Marítima y Fluvial…

Rela – Então, a Academia Uruguaya de Historia Marítima y Fluvial, que foi fundada em 1995, ocorre como conseqüência a uma homenagem que se fez à expedição de Alessandro Males Pina, que esteve em Montevidéu e foi uma grande figura de Espanha. O evento coincidiu com a chegada do Rio da Prata da Nave Escola de Espanha, Sebastião Elcano. E o comandante chefe da armada espanhola nos deu uma conferencia incrível. Nós pensamos, confesso o meu erro, o meu profundo erro, que fosse algo protocolar, mas não… Ele era um sábio. Fez uma dissertação de uma hora e meia sobre todas as vinculações de Espanha e de Portugal desde quase o descobrimento da América por Colombo e de Cabral ao Brasil até o fim do século XVIII. Realmente, como espero que se passe na tua vida, acho que foi uma espécie de toque. Disse, este homem, com esta sabedoria… Aliás, com muita persuasão é a palavra… Uma simplicidade, as coisas mais brilhantes e mais profundas ditas com simplicidade. Isso é comovente. Acho que esse homem, que nunca mais vi em minha vida, e nem se quer sabe, teve uma influencia muito grande, porque me demonstrou as qualidades de um pesquisador, de um homem profundamente compenetrado no seu ramo naval, mas, ao mesmo tempo, um homem com uma simplicidade, de dizer eu conheço isto aqui, mas o que conheço eu conheço muito bem, e é um exemplo para todos. 

RTL – E sobre outras instituições…

Rela – Bom, bom, na etapa da minha vida, que trabalhava metade do tempo nos Estados Unidos e metade do tempo na América do Sul, estive muito vinculado ao Brasil. Fiz um trabalho, uma publicação sobre o teatro jesuítico no Brasil, Argentina e Paraguai, que foi muito bem recebido. Este trabalho foi a base para ingressar na Academia Carioca de Letras, que foi um acontecimento muito charmoso, no Rio de Janeiro e, depois, o Dr. Leodegário Azevedo Filho, que era professor da Federal do Rio de Janeiro, me convidou para integrar a Academia Brasileira de Filologia, que é uma das grandes academias que existem na América do Sul. E, neste mesmo dia, nesta mesma noite, entrei com um eminente professor de Florença, o Dr. Giovanni Tavanni, um grande professor, um grande filólogo, uma eminência na filologia latina. Após isto, também ingressei na Academia do Rio Grande do Sul, como membro de honra. Também estou muito vinculado à PUC, onde realizei meu doutorado em Letras. 

RTL – O Sr. estava a falar sobre o Brasil… Então, pode nos falar da presença luso-brasileira, primeiramente a portuguesa, com a Colônia do Sacramento, aqui no Rio da Prata…

Rela – Bem, Normanjos, que publicou nove tomos que realizei, é uma das mais importantes empresas dedicadas à história, tanto em microcar, quanto em microficha, ou em publicação de livros. Publicou-se nove tomos sobre o Uruguai, desde a Colonização espanhola até agora, até o ano 2000. Um destes tomos está dedicado à Cisplatina. Não só a etapa da presença de Portugal, com Lecor, enfim, que vem a Montevidéu, a luta contra Artigas, como tu sabes, mas também dedicada à parte da cruzada libertadora de Lavalleja, que está muito bem referenciada no artigo que eu li em um dos números da Revista Tema Livre [edição nº 06] e, publiquei, consegui, com muita paciência, com muito cuidado, muita dedicação, todas as atas anteriores ao dia 25 de agosto de 1825. Porque a gente se preocupa com esta data. Mas e o anterior? Dia 18, 19, 20, 21, 22, 23… Procurei tudo. Então, tem uma unidade. A gente chega ao dia 25 quando solenemente um grupo de orientais declara nula e sem nenhum valor os documentos assinados com o Brasil, sendo que é um processo anterior que se vem gestando, e esse é o valor da obra, o valor maior da obra é isso, até que chega a Assembléia Geral Constituinte, e se libera a Independência do Uruguai, com o visto da Argentina, da Inglaterra, do Imperador brasileiro, como tu sabes. 

RTL – Bem, como Lecor e a presença luso-brasileira na década de 1820 são tratados pela historiografia uruguaia?

Rela – Bom, eu diria, subjetivamente. Acho que não se viu todas as virtudes, ou as vantagens que teve, por exemplo, Lecor que, com o Padre Dámaso Antonio Larrañaga, introduz na pedagogia o método lancasteriano, que é muito importante, é um aporte valioso. O método lancasteriano é um avanço revolucionário sobre a pedagogia escolástica dos jesuítas, e a pedagogia da Igreja Católica. Bom, se dá ênfase à Cruzada Libertadora. Mas acho que o período, dos portugueses primeiro e logo brasileiro, com a Independência do Brasil, e que Lecor passa a comandar as tropas brasileiras na Banda Oriental é uma coisa muito importante. Acho que tem que estudar muito, ver com melhores olhos, sem partidarismo, sem sectarismo, com objetividade, que é uma das virtudes do investigador, porque a subjetividade te parcializa, as tendências políticas, ou religiosas, ou o que seja, e comete-se erros. E as coisas, eu aprendi uma grande lição na minha vida, há que faze-las para os vindouros, nada de fazer para o presente. Que os vindouros tenham em ti uma referência. O que tu publicas como documento, aqui tem, por exemplo, todos os tratados entre o reino de Portugal e Espanha para a América Meridional. Aqui estão todos. Isto é o que serve. Não, dizem, que disse que… Não, não. É o que está escrito. O que está assinado. O que está comprometido. O que está para a vida. Por exemplo, 1681 o tratado, o acordo entre Portugal e Espanha pelo qual se toma de novo a Colônia do Sacramento, fundada em 1680 por Manuel Lobo, até o último tratado de El Pardo de 1778, que Espanha reassume, pelo tratado anterior, de 1777… Enfim, de modo que tudo isto é o que importa. Eu sou um documentarista. Me honro de que as coisas são para os vindouros, e as coisas para os vindouros tem que ter a objetividade suficiente para que todos digam não disse que alguém disse. Não, não, não. É o que está escrito, é o que está assinado, o que está nos códigos. Um autor pode interpretar a sua moda, a sua maneira de ver, ter uma visão das coisas. Mas as coisas estão aqui. Acho que é uma lição que aprendi muito jovem, felizmente, com bons mestres, e nunca as abandonei em minha vida. E aconselho aos jovens terem objetividade. 

RTL – O Sr. está aqui com os documentos relativos a Colônia do Sacramento. O Sr. pode falar um pouco deste período da história uruguaia e como a questão é tratada pela historiografia deste país?

Rela – Bom, no livro, que te faço como presente e que resultou em um sucesso neste momento, justamente eu parto da grande idéia que tiveram os portugueses da importância estratégica e geográfica de um ponto em frente ao porto de Buenos Aires, que era a Colônia do Sacramento. Não é um fato fortuito. É um fato muito pensado. Portugal, como tu sabes, tem grande experiência em viagens ultramarinas. Toma o Atlântico Sul, chegou a Índia, ao Brasil, que não é pequena coisa, mas o Rio da Prata é a chave do Atlântico Sul, mas é a chave por vias fluviais Paraná–Paraguai. Quem é dono da trilogia Paraguai, Paraná e Rio da Prata, é dono da chave do Atlântico Sul. Isto a Corte portuguesa viu com muita lucidez. Com grande lucidez. Quando o rei, ou melhor, o príncipe regente, porque Portugal era príncipe regente à época, dá instruções muito precisas a Manuel Lobo, porque sabe da importância que tem isto, e publico aí, neste livro. A outra coisa é o avanço que fazem os portugueses, fronteiras ao sul do Rio Grande, até tocar. Intentam povoar Montevidéu. Fracassam. Zavala vem de Buenos Aires, mandado pelo rei de Espanha, e desaloja os portugueses. Mas a idéia era: Colônia do Sacramento, Montevidéu e Maldonado, três portos de águas profundas, ao contrário de Buenos Aires, são, assim, os donos da chave do Atlântico Sul. 

RTL – O Sr. esteve em Espanha, trabalhou lá, e como esta questão dos portugueses terem estabelecido um ponto luso no Prata é visto pela historiografia espanhola?

Rela – Bom, em Espanha também são parciais… É um século de lutas entre Espanha e Portugal. 1680 funda-se a Colônia do Sacramento, em janeiro de 1680, se desaloja para os espanhóis em 1778. Só faltam dois anos para se fazer um século. E este século de lutas parece tanto importante o tratado de 1750, chamado tratado de permuta ou tratado de Madrid, porque foi assinado em Madrid, que dá os povos das Missões aos portugueses, contando em ter a chave do rio da Prata. Que desenvolve a Guerra Guaranítica que é uma das mais cruéis e horríveis… Guerra em que os exércitos portugueses e espanhóis se juntam para destruir os guaranis, que eram indefesos. E havia labrado com os jesuítas os sete povos. Que está no sul do Rio Grande e a Oeste do Rio Uruguai. 

RTL – O Sr. pode falar um pouco da sua obra, do que se trata, do que já escreveu…

Rela – Prefiro que os outros falem de minha obra. Leia-a e opine. É o melhor presente que podem fazer para mim. 

RTL – E qual trabalho o Sr. está a desenvolver agora?

Rela – Agora estou preparando um grande trabalho de oitocentas, novecentas páginas sobre toda a presença espanhola e portuguesa no Rio da Prata, século XVI, XVII e XVIII. É um trabalho muito importante e pega quase todos os tratados. 

RTL – Finalizando, qual a sua opinião a respeito do uso da internet para a divulgação da história?

Rela – Bem, eu tenho uma dedicação muito grande à internet. Tenho uma comunicação com quase todo o mundo, me interessa, estou inscrito em jornais muito importantes, do Brasil, Argentina, Chile, México, Espanha, Estados Unidos… E, também, através do “Yahoo!”, “Google” ou “Altavista” tenho relações com a história, com o passado, então, para mim, é um instrumento muito importante a internet. Pela internet eu conheci a Revista Tema Livre, assim que maior coisa não pode ser. 

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