Especialistas trazem dicas de como famílias e educadores podem organizar visitas a museus e, com isso, despertar o interesse por arte desde cedo

 

por Maria Victória Oliveira

 

Ver de perto obras de arte históricas, em diferentes partes do mundo, exige o planejamento de uma viagem – ou, em alguns casos, uma boa conexão para acessar o acervo de museus virtuais. Ao vivo, é preciso levar em consideração o respeito ao ambiente silencioso e organizado, às vezes pouco atrativo para as crianças. Mas como despertar o interesse dos pequenos para o universo artístico, estimulando-os aos passeios pelos museus? E mais, como abrir portas para um pensamento mais complexo a partir das obras em exibição?

Para a artista Inaê Coutinho de Carvalho, coordenadora de projetos de formação de professores da Rede Arte na Escola, do Instituto Arte na Escola, incentivar o gosto pelas artes desde cedo traz múltiplos benefícios.

“Alguns países têm o hábito de levar crianças pequenas, da educação infantil, para o museu, e isso cria alguns aspectos bem importantes, como a apropriação do espaço e das obras que estão sendo expostas. Além disso, falando do ponto de vista da apropriação da linguagem, existe um desenvolvimento cognitivo e um aprender pelos olhos por essa apreciação e contemplação do objeto artístico, seja o museu de artes visuais, esculturas ou um equipamento cultural que tenha dança, teatro, cinema”, detalha Inaê.

 

Estímulos desde cedo
Enquanto campo de conhecimento, a arte favorece o desenvolvimento de outros campos, como o raciocínio científico. E não é necessário entender sobre arte para ver arte, como comenta a coordenadora.

“A arte tem acesso direto ao nosso corpo como um todo, aos nossos sentidos. Você pode associar o que vê a um cheiro, uma memória. Ou seja, pode-se dizer que a arte te deixa mais inteligente, porque você faz conexões simbólicas, e o pensamento simbólico é muito importante para o pensamento científico e lógico.”

 

Independência ou Morte, de Pedro Américo, faz parte do acervo do Museu do Ipiranga

 

Entretanto, é preciso considerar que, aqui no Brasil, os museus ainda são espaços pouco visitados. Uma pesquisa do Instituto Oi Futuro, de 2018, mostrou que, para metade dos 600 entrevistados pelo levantamento, os museus são espaços monótonos e elitizados. Mas, para 55% das pessoas ouvidas, a primeira visita a um museu foi por meio de excursões da escola, o que reforça o caráter educacional da proposta.

“É um lugar que, em geral, as pessoas não têm o hábito de ir, têm até um certo constrangimento porque nunca foram, não sabem como se portar”, diz Inaê. Portanto, levar crianças aos museus é uma forma de que eles aprendam esses ‘códigos’ desde cedo.

 

Dicas para educadores e famílias
Para entender como educadores e famílias podem incentivar a curiosidade de crianças e jovens e, assim, estimular seu interesse pela arte, o Porvir também conversou com Milene Chiovatto, coordenadora do Núcleo de Educação da Pinacoteca de São Paulo.

Para Milene, levar crianças até os museus pode ser ainda um momento privilegiado para a construção de relações de sociabilidade familiar. “Uma família pode conversar durante bastante tempo a partir de um único objeto exposto no museu. Além disso, as crianças, por terem sua maneira particular de perceber o mundo, podem contribuir com sua visão e interpretação sobre as obras apresentadas nos museus.”

 

Visite o site da instituição
Acessar o site, checar as orientações para a visita – como compra e preço de ingressos, marcação e visita educativa, quantidade de pessoas por grupos, melhores horários e dias, preparativos recomendados por cada instituição, bem como questões de acessibilidade para crianças com deficiência – são alguns passos importantes que podem aprimorar a visita.

 

Paço Imperial: o prédio histórico costuma oferecer exposições de arte no centro do Rio

O que fazer durante a visita ao museu
Uma dica que cabe a familiares e educadores é estimular e explorar o senso de curiosidade das crianças, como incentivar que busquem o menor objeto da sala, ou aquele que tem sua cor preferida, ou simplesmente o que ela mais goste.

“Ao fazer isso, os pais estimularão sua observação atenta, processos de seleção, interpretação, reconhecimento e relações com outras coisas já conhecidas além de aguçar sua curiosidade. Os pais devem estar dispostos a ouvir, conversar e entender que o conhecimento é uma construção coletiva, suspendendo o julgamento sobre as percepções e interpretações infantis. Não é produtivo assumir o papel de ‘sabe-tudo’ e desautorizar a criança em sua exploração”, reforça Milene.

 

Use lista de palavras
Outra dica que serve para visitas em família ou com a escola é separar, antes da visita, uma lista de palavras-chave que os pais julgam interessantes e os professores acreditem ser fundamentais para o tema ou conteúdo pedagógico que está sendo trabalhado em sala de aula. Assim, devem estimular que as crianças relacionem as palavras àquilo que está sendo observado na visitação.

“Mais do que julgar as percepções e interpretações, os responsáveis devem ouvir, conversar e aguçar o desejo de conversação, sempre perguntando o porquê das escolhas.”

 

Inverta os papéis
Uma possibilidade interessante é colocar as crianças no papel de questionadoras. Ou seja, incentivar que elas façam perguntas a partir do que observaram.

 

Interior do Palácio de Queluz, em Portugal, aberto à visitação

 

Inclua a visita como parte de um projeto
Para Milene, incluir a visita ao museu em um projeto maior ajuda a ter mais significação para além de uma visita pontual. A coordenadora comenta que não necessariamente apenas professores ligados às disciplinas relacionadas às artes podem aproveitar o espaço dos museus. “A partir do conteúdo pedagógico que está sendo desenvolvido em sala de aula, caberá ao professor articular com a instituição ou exposição que melhor atende suas necessidades.”

 

Evite demandar muitos trabalhos
Associar a visita a um museu a uma atividade trabalhosa pode fazer com que os alunos passem parte do tempo copiando dados de etiquetas e placas, dando menos atenção à visitação em si. Trabalhos em grupos e sempre baseados em perguntas, se possível interpretativas, são outra boa dica, comenta Milene.

“Imagine chegar com sua turma e dividi-los em grupos de três, estimulando-os a achar nas salas que vão visitar, um objeto que – para eles – possa significar uma prova do desenvolvimento humano. Cada grupo poderá justificar suas escolhas e a visita será tanto mais produtiva quanto mais os grupos puderem buscar por si mesmos seus interesses e interpretações.”

 

O que fazer depois da visita ao museu
Debater em sala de aula, relembrar os principais objetos, eleger coletivamente um objeto para uma análise aprofundada, propor a construção de uma exposição da turma sobre o tema que estão estudando, desenvolver etiquetas para os objetos, construir um roteiro de visitação são apenas algumas das opções de propostas que se seguem à visita a um museu.

 

Promova releituras e investigações
Trabalhar com grafite, propor desenhos, pinturas, colagens, instalações, propor releituras dos objetos que os alunos mais gostaram são outros caminhos que podem ser seguidos depois da visitação.

“Outra possibilidade é investigar sobre a época em que uma obra foi feita, e levantar junto a outros docentes, conteúdos dessa época, entendendo o fenômeno artístico como uma produção e uma determinada época, conectando conteúdos de arte, história, língua portuguesa e geografia, por exemplo. Ou ainda estimular os alunos a usarem as câmeras de seus celulares e captar imagens que tenham relação com uma das obras ou conteúdos tratados, formando um grande painel coletivo ao final”, sugere Milene.

 

Créditos
Texto de Maria Victória Oliveira publicado originalmente no Porvir (https://porvir.org/visitar-museus-desde-a-infancia-ajuda-a-desenvolver-pensamento-critico/?utm_campaign=shareaholic&utm_medium=whatsapp&utm_source=im)

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