A decisão do governo Trump de elevar tarifas contra produtos brasileiros retoma 200 anos de relações entre Brasil e Estados Unidos, marcadas por alianças estratégicas, disputas comerciais e redefinições geopolíticas.

 

Da redação.

 

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O novo pacote de tarifas norte-americanas sobre produtos brasileiros, anunciado em julho de 2025 pelo governo de Donald Trump, reacendeu tensões político-diplomáticas entre o Brasil e os Estados Unidos. As medidas afetam relevantes setores da economia brasileira, como o agronegócio e a siderurgia, sendo que o episódio expõe também a assimetria persistente entre os dois países mesmo após dois séculos de relações formais.

 

 

O início: Brasil Império

Os Estados Unidos foram um dos primeiros países a reconhecer a independência do Brasil. O fez em 1824, antes da Inglaterra e de Portugal. Em linhas gerais, ao longo do século XIX, o Império via os EUA com certa reserva, mas também pragmaticamente como alternativa à hegemonia europeia.

 

 

 

A República e a aproximação estratégica

Bandeira do Brasil durante o início da República em 1889, com listras verdes e amarelas e estrelas brancas em fundo azul.
A bandeira brasileira adotada nos primeiros dias da República diretamente inspirada na dos Estados Unidos.

Com a proclamação da República em 1889, o Brasil passou a olhar os EUA como referência institucional, inclusive o país sul-americano adotou a designação Estados Unidos do Brasil. A inspiração no modelo federativo norte-americano foi igualmente visível na Constituição de 1891.

A nova ordem republicana reforçou os laços comerciais e diplomáticos, mas o relacionamento permaneceu baseado em interesses pontuais. Além disto, não anulou-se a influência europeia em outros âmbitos da sociedade. Como exemplo, diversas cidades brasileiras foram remodeladas inspiradas em Paris, basta lembrar-se da reforma Passos no Rio de Janeiro, ainda que no início do século XX tenha havido uma aproximação estratégica com os estadunidenses, vistos como contrapeso à influência britânica.

 

 

 

 

A Segunda Guerra Mundial e a industrialização brasileira

Durante o Estado Novo (1937 – 1945), Getúlio Vargas utilizou a rivalidade entre a Alemanha e os EUA para negociar vantagens para o Brasil. Neste contexto, surgiram acordos como o que resultou em empréstimo norte-americano ao governo brasileiro para a construção da Companhia Siderúrgica Nacional (CNS), em Volta Redonda, no interior do Estado do Rio de Janeiro. O envio da Força Expedicionária Brasileira (FEB) à Europa reforçou o papel do país como aliado estratégico. Ao fim da guerra, os EUA exerceram papel central no redesenho da ordem internacional — e o Brasil buscou, com ambivalência, manter seu espaço nesse novo cenário.

 

 

Crises e tensões durante a Guerra Fria

Ao longo da Guerra Fria (1947 – 1991), os Estados Unidos intensificaram sua presença política, econômica e militar na América Latina. Um dos episódios que merece destaque foi o apoio estadunidense ao golpe de 1964: diante da percepção de que o governo de João Goulart flertava com setores da esquerda latino-americana, os EUA passaram a considerar sua deposição. Durante a chamada Operação Brother Sam, embarcações militares foram mobilizadas para oferecer suporte logístico aos golpistas brasileiros — embora não tenham sido efetivamente utilizadas, pois Goulart não resistiu. O apoio diplomático e econômico estadunidense veio em seguida, com o reconhecimento imediato do governo militar recém instalado e envio de recursos financeiros para a economia brasileira.

 

 

 

 

Na década de 1970, a política externa estadunidense sob a presidência de Jimmy Carter colocou nova pressão sobre o Brasil. A defesa dos direitos humanos tornou-se prioridade, e o regime militar brasileiro passou a ser alvo de denúncias formais. Os EUA tentaram, ainda, interferir no acordo nuclear firmado entre o Brasil e a Alemanha, que resultou na construção da Usina de Angra dos Reis, no litoral fluminense. O desconforto gerado levou o governo brasileiro a romper unilateralmente um acordo militar de cooperação com os EUA, em um dos pontos mais agudos da crise diplomática entre os dois países naquela década.

 

 O papel dos EUA durante a ditadura segundo James N. Green

James Green, historiador norte-americano especialista em Brasil

Em entrevista concedida à Revista Tema Livre durante o XXII Encontro Nacional de História, o historiador norte-americano James N. Green destacou o papel de acadêmicos, ativistas e clérigos dos EUA na denúncia da repressão no Brasil. Segundo o brasilianista:

“Esses acadêmicos e clérigos montaram um comitê para denunciar internacionalmente a tortura e a repressão no Brasil. […] Colocaram avisos pagos no New York Times denunciando, por exemplo, a prisão do Caio Prado Júnior em 1970, tentando criar uma nova imagem do Brasil.”

Green também relembrou a atuação de parlamentares norte-americanos, como o senador Frank Church, que realizou uma CPI em 1971 sobre o apoio dos EUA a regimes que violavam direitos humanos. Segundo o historiador, essa articulação teve impacto político em Washington e contribuiu para pressionar o governo brasileiro.

 

Leia a entrevista completa com o Prof. Dr. James N. Green clicando aqui.

 

Espionagem no século XXI

Em 2013, veio à tona outro episódio de forte desgaste nas relações entre os dois países americanos. Documentos vazados por Edward Snowden revelaram que a Agência de Segurança Nacional dos Estados Unidos (NSA) espionava autoridades brasileiras, incluindo a então presidente Dilma Rousseff. A revelação gerou crise diplomática imediata: a presidente cancelou uma visita oficial aos EUA, e a confiança mútua foi severamente abalada. A normalização das relações só viria dois anos depois, nos momentos finais do governo Obama, por meio de canais diplomáticos discretos.

 

 

Tarifas de 2025: uma reedição de velhas assimetrias

A imposição de novas tarifas pelo governo Trump contra produtos brasileiros, em 2025, reacende debates antigos sobre dependência econômica, vulnerabilidade comercial e assimetrias estruturais entre Brasil e Estados Unidos. O gesto político, embora recente, está inserido em um padrão histórico que combina cooperação estratégica com disputas por espaço e influência. A história das relações entre os dois países é marcada menos por consensos duradouros e mais por reconfigurações periódicas, à medida que os contextos regionais e globais se transformam.

 

 

 

 

📌 Perguntas Frequentes (FAQ)

Quando os Estados Unidos reconheceram a independência do Brasil?
Os EUA reconheceram a independência do Brasil em 1824, antes de Portugal e da Inglaterra.

O que foi a Operação Brother Sam?
Foi uma operação de apoio logístico dos EUA ao golpe de 1964, com embarcações posicionadas para auxiliar os militares brasileiros, embora não tenham sido usadas.

Quais foram os impactos da política de Jimmy Carter nas relações com o Brasil?
Durante seu governo, os EUA pressionaram o Brasil por violações aos direitos humanos e questionaram acordos nucleares com a Alemanha.

O que gerou a crise diplomática durante o governo de Barack Obama entre Brasil e EUA?
A revelação de que a NSA espionava autoridades brasileiras, incluindo a presidente Dilma Rousseff, provocou uma grave crise diplomática.

O que motivou a imposição de tarifas contra o Brasil pelo governo Trump em 2018?
Em 2018, o governo Trump impôs tarifas sobre o aço e o alumínio brasileiro alegando preocupações com segurança nacional, num contexto de política protecionista.

O que são as tarifas EUA Brasil 2025?
Tarifas de 50% para a importação de diversos produtos brasileiros. A decisão foi interpretada por analistas como parte de uma estratégia de pressão econômica e política.

Como o Brasil reagiu oficialmente às medidas de Trump?

O governo brasileiro apresentou notas diplomáticas de protesto, buscou negociação bilateral para reversão das tarifas e notificou o caso à Organização Mundial do Comércio (OMC), argumentando violação de acordos multilaterais.

 

 

Cite a matéria corretamente:

REVISTA TEMA LIVRE. Relações Brasil–EUA: 200 anos entre disputas e alianças. Niterói, 23 jul. 2025. Disponível em: https://revistatemalivre.com/relacoes-brasil-eua-200-anos-disputas-e-aliancas/ Acesso em: [colocar a data].

 

 

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